sexta-feira, 15 de abril de 2011

A PORCA DA POLITICA!

Por: Zé dos Anjos, 2011/04/15.

O Sr. Eduardo do Nascimento Canavez
Hoje lembrei-me do Sr. Eduardo Canavez, homem de forte carácter, inteligência rara, perspicácia ímpar e uma imensurável fonte de conhecimento, o que, acrescido do saber ouvir, saber falar e saber estar e do seu jeito de homem sem medos, fizeram dele uma referência e exemplo de cidadania e coragem.

Na escola não pôde ir além do ensino primário. Mas as artes, as letras, a música, a sociedade e a política eram, para o Sr. Eduardo, assuntos sem segredos nem tabus. Os seus escritos eram marcantes e intensos. As suas marchas populares ainda hoje são lembrados e trauteadas pelos mais velhos.

São também famosas as suas intervenções directas, frontais, Tête-a-Tête com os políticos da época que, dizem-nos, deixavam quase todos a tremer.... pois quando ninguém ousava sequer abrir a boca (porque podia alguém ouvir), ele ia em frente, sem tremedouras, fosse junto do simples secretário camarário ou fosse junto do próprio Ministro que por cá passasse e, em vez dos aplausos encomendados e ensaiados, ele, em voz segura, clara, precisa e concisa, questionava os porquês. Irradiava respeito. Incomodava o poder, os eterna e obrigatoriamente  aplaudidos, porque sabia o que dizia (incontestável), como dizia (irrepreensível no trato), quando dizia (na hora certa) e onde dizia (no lugar apropriado, para todos ouvirem). !
A sua luta era pela família e pela comunidade, era pela sua terra, pela verdade e pela justiça! Não fosse ele portador de grande incapacidade motora e certamente os calabouços da PIDE/DGS teriam tido mais um hóspede assíduo!

Mas hoje lembrei-me do Sr. Eduardo especialmente porquê?
Era eu ainda um jovem adolescente. Numa das muitas vezes que, pelo fim da tarde, ia até ao pé do Sr. Eduardo (valia a pena uns minutos de conversa com o Sr. Eduardo), estava ele sentado, como sempre naquele pequenino muro em frente da sua casa, encostado à parede da cabine telefónica, com o ombro direito sobre uma das suas “muletas” e rodeado por vários vizinhos (qual tertúlia domingueira!), alguns de olhar medroso não estivesse por ali algum bufo encoberto - ajuntamentos de mais que 2 pessoas eram proibidos e falar de certas coisas  era ainda pior! -, outros de olhar fixo, bocas semiabertas não perdendo uma palavrinha do que o Sr. Eduardo dizia. Com aquela clarividência que chegava a ser “arrepiante”, presenteava-nos ele com mais uma das suas irrecusáveis conversas, falava de factos e coisas recentes, de injustiças, dos oportunistas, do abuso do poder, das necessidades do povo (não, não era comunista, nada disso!), e, no fim, serenamente, mas com voz forte e profunda, concluiu qualificando:
A PORCA DA POLITICA!

Este lamento, acusação ou sofrida desilusão, dito com enorme convicção calou cá bem no fundo, de tal jeito que, ainda hoje, passados muitos anos, “ouço” (tantas vezes!) aquele desabafo de encher a alma: A PORCA DA POLITICA!

Afinal os tempos não mudaram tanto assim! Há coisas para as quais o tempo não passa!

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