quarta-feira, 7 de julho de 2010

À CONVERSA COM O TUELA, por Silva da Eira

À CONVERSA COM O TUELA
por: Silva da Eira

Dizem por aí que, nalguns dos teus espaços e nas mais amplas margens se encontram agora  zonas designadas  por Praias Fluviais (que nome pomposo!), tu conheces? Eu não! Só conheço e vejo lugares destruídos, inacabados, sujos e malcheirosos.


Tuela, hoje ganhei coragem para uma conversa contigo! Antes de mais, como ser humano, quero pedir-te desculpa por tanta vilania que,  ao longo das últimas décadas, por acções dos da minha raça, tens sofrido. Deves estar revoltado, eu também estou.

Nas tuas margens, no teu leito e enseadas, tantos de nós fomos felizes, crescemos como homens, conhecemos pessoas das aldeias vizinhas e até de muitas outras paragens, o convívio era são, o ar era puro, as tuas águas cristalinas e transparentes como o coração e a alma daquela gente boa que te fazia companhia.

Não vou tão pouco enumerar os tantos lugares idílicos e bucólicos que as tuas margens nos ofereciam, mas deixa-me só lembrar a açude, a azenha e as frieiras de Contins, ou a açude e a azenha de Vale de Juncal nos, ainda não muito distantes, anos 70. Que vontade de poder regressar ao tempo antes dos ataques violentos que sofreste nas tuas bandas ripícolas e no teu leito com a desenfreada extracção de areias, sentida como o esventrar do teu coração!

Mesmo vítima de tantos ataques e agressões, vais conseguindo recompor-te a ponto de ainda nos proporcionares alguns dos teus encantos que, juntamente com os nossos vizinhos e outros que te  visitam e respeitam, deleitosamente usufruímos.

Mas agora, selvaticamente, fizeram de ti um esgoto, vitima inocente e indefesa das Mini-Etar’s, idealização politica para produção de duvidosas estatísticas de saneamento básico e projectadas por analfabetos em ciências de cálculo, enquanto que, outros oportunistas te acorrentaram, aprisionaram e emparedaram em autenticas fortificações de cimento a que chamam de Mini-hidricas, mas que não passam de verdadeiras “máquinas registadoras” comandadas por interesses económicos sem sensibilidade nem escrúpulos.

Conspurcado por uns, aprisionado por outros, restam-te alguns dos teus amigos de sempre que não te abandonarão! Mas tens de lançar o teu grito, qual queixume de revolva. Eu e muitos outros estaremos de volta, bem na primeira linha para que te sintas o verdadeiro rio que já foste , que a tudo em teu redor davas vida e às “tuas gentes” transmitias felicidade.

Dizem por aí que, nalguns dos teus espaços e  nas mais amplas margens se encontram agora  zonas designadas  por Praias Fluviais (que nome pomposo!), tu conheces? Eu não! Só conheço e vejo lugares destruídos, inacabados, sujos e malcheirosos.

Revolta-te amigo, mostra a tua indignação, reclama a vida que a natureza te deu e te roubaram! Estamos contigo.

O amigo,
Silva da Eira.

Nota do autor: Espero voltar novamente a este blogue para despertar algumas consciências adormecidas, agradecendo desde já aos seus administradores esta oportunidade. Sei que o passado já lá vai, todavia, sem falsas nostalgias, acredito que os valores perduram

Nota da administração do blogue:
O constante deste artigo expressa apenas a opinião do autor e não vincula a instituição que titula este blogue.

1 comentário:

piusquinha disse...

O que o autor nos descreve é efetivamente um exemplo da perda de valores dos nossos tempos! Quando não sabemos respeitar o que generosamente a Mãe Natureza nos oferece muito menos nos respeitamos a nós próprios e aos outros. Que se torne num "grito de revolta" do Rio Tuela e de muitos outros "Tuelas" do nosso maravilhoso País, assim o saibamos conservar e valorizar.
Obrigada ao autor e aos admninistradores do Blog ao proporcionarem a leitura deste belo texto.